Entrevista: Glenn Greenwald, o LGBT Mais Influente no Brasil 2019

Jornalista trincou os alicerces da operação Lava Jato e faz da sua vida afirmação de cidadania

Publicado em 02/02/2020
Glenn Greenwald é eleito LGBT mais influente de 2019
'Temos que sermos abertos sobre quem somos', diz premiado jornalista

Ele trabalha com palavras. Fortes. Isso no jornalismo. Há muito, Glenn Greenwald é profissional de mídia que faz da coragem sua marca de trabalho. Foi assim no mundialmente conhecido caso Snowden, de 2013, em que revelou documentos secretos sobre o governo dos EUA. 

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Ele espraia palavras. Incentivadoras. Isso no ativismo LGBT. É o que fica demonstrado nesta entrevista do jornalista à nossa reportagem feita por ele ser reconhecido como a personalidade LGBT Mais Influente no Brasil em 2019.

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E para além das palavras, Glenn torna sua vida exemplo de determinação. Na profissão, como editor fundador e colunista do site The Intercept Brasil, incomodou a maior ação judicial do Brasil contra corrupção, a Lava Jato, e o seu maestro principal, o ex-juiz e agora ministro da Justiça Sérgio Moro. Em 2019, o jornalista publicizou conversas em que ficaria demonstrada relação indevida entre o jurista e procuradores que atuam na operação. 

E na vida pessoal a assertividade sobre o que deve ser feito é também férrea. Casado com o brasileiro e deputado federal David Miranda (Psol-RJ) e com dois filhos adotivos, Glenn defende o reconhecimento dos seus como família e se levanta contra quem se opor aos direitos e à cidadania LGBT. 

E é com esse histórico que Glenn faz convocação: "Temos que ser abertos sobre quem somos, sobre nossos casamentos, sobre nossos relacionamentos, de modo a mostrar às pessoas a verdade e não permitir que essas campanhas de demonização sejam bem sucedidas." 

Convocação para a palavra e para as atitudes.

Como é ser eleito o LGBT mais influente do Brasil?
Estou extremamente honrado de receber esse reconhecimento. Isso porque acredito que é a obrigação de todos os LGBT que possuam alguma plataforma e privilégios - em especial no clima hostil e violento contra LGBT com o que o Brasil atravessa - inspirar LGBT jovens - ou qualquer LGBT, na verdade - que estejam passando por pressões, violência, rejeição ou estigma e mostrar para eles que uma vida plena e completa é possível, que é exatamente o que o governo atual, o movimento que o sustenta e diversos outros setores da sociedade estão tentando convencer LGBT que não é possível.

Como você avalia o ano de 2019 para LGBT levando em conta ativismo, cidadania e ações do poder público?
Acredito que foi bastante interessante para ativismo e movimentos politicos relacionados à causa LGBT no Brasil. Há por um lado várias ameaças e coisas negativas que aconteceram, a começar pelo presidente e sua família, que detêm bastante poder e em larga medida construíram suas plataformas estimulando ódio, hostilidade, ataques e estigma contra LGBT.

Mas, por outro lado, acredito que esse clima hostil gerou também uma resposta em que muitas pessoas, não só eu e meu marido David Miranda, o primeiro LGBT a ser eleito para a Câmara Municipal no Rio de Janeiro e que agora é um de pouquíssimos membros abertamente LGBT do Congresso, mas também LGBT do mundo do entretenimento, jornalismo, política, que estão assumindo essa responsabilidade, percebendo que não podemos simplesmente ficar quietos, não podemos nos contentar com nossa própria situação confortável, mas, sim, de que temos uma responsabilidade, temos que existir abertamente, vocalmente, e marcar presença.

Temos que ser abertos sobre quem somos, sobre nossos casamentos, sobre nossos relacionamentos, de modo a mostrar às pessoas a verdade e não permitir que essas campanhas de demonização sejam bem sucedidas. E, nesse sentido, acho que ironicamente, em 2019, vimos mais ativismo, mais movimentos politicos em defesa de LGBT do que em qualquer outro momento da história - principamente porque percebemos que temos essa responsabilidade, agora que nossos direitos, nossa igualdade e nossa existência estão sob ataque.

Qual a importância que você acha de um homossexual ter tamanha projeção nos campos da política e do jornalismo no Brasil como você teve?
Uma das coisas que eu acho mais gratificantes é que eu posso ser uma pessoa abertamente LGBT com uma plataforma bem grande, mesmo que meu trabalho não seja diretamente relacionado à causa LGBT.

Eu me lembro, há uns anos, durante as reportagens do caso [do analista de sistemas Edward] Snowden, depois que o David foi detido em Londres por causa do trabalho que ele vinha fazendo conosco no arquivo Snowden, quando ele voltou para o Brasil, eu fui buscá-lo no aeroporto e finalmente nos reencontramos e, claro, nos abraçamos e nos beijamos.

Essa imagem da gente abraçado circulou pelo mundo todo, e deixava claro que nós somos um casal LGBT que estava não no meio de uma polêmica sobre a causa LGBT, mas, sim, de uma polêmica politica, jornalística e diplomática de interesse global que tratava de questões sem nenhuma relação com assuntos LGBT tais como vigilância, privacidade etc.

E eu acho que é extremamente importante que LGBT não sejam estereotipados ou confinados a determinados trabalhos. Nós não somos somente ativistas LGBT - não querendo diminuir a importância desse ativismo fundamental - nem estamos restritos ao mundo artístico, mas, sim, estamos ocupando todos os espaços: jornalismo, política, negócios, religião.

Isso passa a mensagem fundamental que, ao contrário da narrativa que nos demoniza e diz que somos condenados a vidas incompletas, tristes de solidão e tristeza, nós podemos, sim, ter famílias, nós podemos nos casar, nós podemos ter qualquer profissão que a gente queira, nós podemos ser bem sucedidos nessas profissões sem ter que nos esconder, vivendo abertamente como qualquer pessoa. E eu acho que é crucial que LGBT em qualquer lugar, se puderem, vivam abertamente para mostrar que nós existimos e podemos também ser felizes.


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